RODRIGO GARCIA LOPES

(Brasil)

 

Poemas

 

 

 

 

RITO

 

 

Alertas, trapaças, cobranças, compromissos:

Quantas ilhas sem edição, vidas sem viço,

A morte visita sem aviso?

E, afinal, pra que mesmo tudo isso?

 

O que deu nesse mundo, caduco,

O que ficou do tempo em que viver

Era mais que só mudar de assunto

Era rito, um estado de espírito?

 

Ou quando olhar era uma reza,

Pensar que revelava a leveza,

Música vindo de dentro

(Precisa de centro?)

 

Uma revolução do sentir nos fez ateus:

Quisemos então ver a face de Deus.

 

E você a meu lado, lembra

De quando bastava uma fagulha

Pra explodir uma Bastilha?

 

 

 

JOGOS PATRIÓTICOS

 

A chuva na xícara de Sha. Os pátios estão vazios, céus simulando seus azuis etc.

 

Símile - smile - simulacro - míssil.

 

O papel suga o nanquim, draga sua substância & chapa insignificâncias numa superfície iluminada, infalível.

 

Ilha negra. Signos pulsam.

 

Abrimos envelopes com angústia: só encontramos papéis brancos.

 

Onda, sílaba que se quebra ali, beira de lábio.

 

Pensa na verdade, quimera, enquanto folheia com um olho as primeiras folhas de erva.

 

Cansaço, telefones suspensos, fora dos ganchos…

 

O ego se rasura, sous rature, se sutura; olha-se no espelho e vê apenas suas costas.

 

Thalassa, - ad infinitum.

 

 

S.

 

Prise seca, chuva ácida, dedos de prosa descontínua e abissínia...

 

Um abismo.

 

Linguagem em zig-zag, acuada por um zugzwang, scuds sobre uma zona neutra.

 

Um zap, e a lua se dilui. Um vôo de zen a zoom. Zeitgeist?

 

Lógica polaróide.

 

Esperas & desaparições.

 

Você se fixa e asfixia, não percebe

 

O veneno da serpente, o momento seguinte da sentença.

                                                                                                                                                 Arizona, USA, (1990)

 

 

 

 

 

 

peônias negras

serenas

quase secas

 

 

pombos se aquecem

num resto

de sol

 

uma planta

luta para

romper a fenda

 

formigas dragam

uma abelha

ainda viva

 

o inverno

furta a flor

a cor da fruta

 

(gestos & acenos

de sombras

não consolam)

 

a tarde passa

arrasta e deixa

um rastro prata

 

 

 

 

 

 

THOTH  

                                       

                                                                                                Storm Reality Studio, and retake the universe

 

                                                                                                          William S. Burroughs

  

        Os ruídos fazem sexo com as coisas superiores do Imenso, Sodium, silêncios reduzindo ruídos a seu nexo, nenhum.  O Imenso que se vire com seu Kamasutra, seu Wittgenstein, seu walkman que detona todas nas festas de Thot.  Quase imensa, ruína Angkor florindo Vietnans, o mar armadilha cicatrizes, e a pele é um bilhete de faraó.

 

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O rio tremia na membrana, na mente do brâmane, na escama da penumbra, na pompa da alma: um gelo; uma prise revela vales espessos - aromas de morte: cristais... A vida se exila aqui, líquida... E quanto ao conteúdo, diríamos, trata-se de um processo alquímico incessante como o som que sopra dos rios ou chuva de meteoros no lago, a sombra de Iago, e essa noite animal.

 

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Centelhas do invisível, farpas de Osíris, o silêncio desnudando o segredo de pétalas secas; o paradoxo da chuva processando seus metais.  Tudo se faz luz quando a luz se liquefaz em som, chuva fora de estação.  Sinais.  Serpes espiralam em sua pele, deixando ali sua dupla exposição, na transferência de ruínas que o olho reúne, e arruína.  Dopado pelo ópio do carinho, com a distância tênue de um doutor fora de posição, ele navalhava o pensamento egípcio, preciso, de um sonho total.  Apoteose de risos, rios de Osíris, Sol: joías nos crânios e ossos que descem o Nilo.  Como aquilo virou isso?  Eles, modernos, que mordam a carne bizarra e abocanhem sua módica ração, seu Estúdio Realidade.

 

 

EL DUENDE

 

O dia lapida

o lado mais raro

da dor.

 

A mulher transpira

pelos poros iridescentes

dos dias.

 

Há dias

em que um homem

tem o tamanho de uma flor.

 

 

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